terça-feira, 4 de setembro de 2012

Um circo de lona nova


O grupo Dona Zefinha lança disco com trilha sonora do show "O Circo Sem Teto da Lona Furada dos Bufões"
O espetáculo, que acaba de ganhar registro em disco, foi sendo construído no decorrer dos anos: performance remete a histórias vividas pelo próprio grupo, criado no começo dos anos 2000
Ora teatro de rua, ora palhaços de circo, ora banda de música independente. Ou melhor, um misto de tudo isso. Em 20 anos de trabalho, os irmãos Ângelo Márcio, Orlângelo Leal e Paulo Orlando sedimentaram uma parceria artística multifacetada, onde as diferentes linguagens naturalmente se misturam. Reunidos no grupo Dona Zefinha - família artística que conta ainda com a esposa de Orlângelo, Joélia Braga e os amigos Wagner Ferreira e Vanildo Franco - eles lançam este ano em disco o registro de um de seus espetáculos mais marcantes: "O Circo Sem Teto da Lona Furada dos Bufões".

 O disco materializa o trabalho desenvolvido pelos irmãos desde o início de suas "traquinagens" artísticas, como palhaços-músicos, em sua cidade natal, Itapipoca. Criado e recriado ao longo das quase duas décadas (antes mesmo da formalização da banda), o espetáculo infantil resgata o humor e as brincadeiras tradicionais dos palhaços nordestinos, temperadas pelos ritmos de nosso cancioneiro nas misturas e experimentações do grupo. Músicas que, ao mesmo tempo, narram e sonorizam a história, cativando as crianças de hoje, apresentando um universo circense já em extinção, e mexendo com a imaginação e recordação dos pais.

O trabalho contou com direção musical de André Magalhães, arranjos de Gustavo Portela, que também faz participação como instrumentista. Além dele, a gravação tem presença das cantoras Aparecida Silvino e Cristina Francescutti, e a violoncelista Tamily Braga. Bem cuidado, além do refinamento sonoro, o disco traz um belo encarte, em formato retangular, com intervenções de Ângelo Márcio e  os dedos do fotógrafo Alex Hermes e do designer Ramon Cavalcante.

Músicas

O registro foi feito parte ao vivo, tomado em 2011 no Q.G. do grupo, a "Casa de Teatro Dona Zefinha", em Itapipoca. "Passamos (a banda Dona Zefinha) um mês sozinhos, concentrados no processo de refinamento, definição de arranjos. Também ficamos um tempo com Gustavo Portela. Foi um período de descoberta de que música ficava melhor com que instrumento", lembrou Orlângelo Leal sobre o processo de pré-produção. Para a gravação, conta, foram nove dias em total imersão, gravando, escutando e regravando, "sem saber se era tarde ou noite".

O resultado chega ao público em 12 faixas divertidas e bem exploradas musicalmente. Seja na instrumentação - com timbres de efeitos, programações, percussões diversas e arranjos para violino, trombone, trompete, tuba, banjo, guitarra - seja nas referências à música circense entremeada com xotes, valsas e baladas. As letras cantam causos como o do Sapo Cururu, a Baratatomica, Ravel o comilão e Maneco, mágico, palhaço, trapezista e equilibrista do Circo da Lona Furada. Tudo bem recheado de brincadeiras sonoras. Lançado há menos de um mês e prensado inicialmente em mil unidades, o disco, que, por enquanto, é vendido apenas em apresentações do grupo e contatos via internet, já está quase esgotado e uma segunda prensagem, de três mil unidades, está a caminho.

Transformações

As primeiras aparições de "Os Bufões", segundo Orlângelo, aconteceram ainda no início da década de 1990. À época, com palhaçadas temperadas por músicas de Tom Jobim, Chico Buarque e Vinicius de Moraes. "A performance e a música sempre estiveram juntas. É uma marca da nossa história. E, neste começo, nós fomos muito influenciados pela geração que compôs música para criança nos anos 1980", recorda ele. De Itapipoca a Fortaleza, em 2001, os três irmãos criam a Dona Zefinha, sobressaindo-se mais o lado musical que o teatro e o humor. "Os Bufões", como era conhecido de início o espetáculo, seguiu embalado por músicas da infância dos três.

Em paralelo, surgiu o disco "Cantos e Causos" (2001), que reuniu as primeiras composições do grupo, e apresentações teatrais, como "O Casamento de Tabarim" (2003).

Peça constante, no entanto, no repertório do grupo, a partir de 2008, "Os Bufões" começam a ganhar músicas originais - aproveitando a maturidade para compor do grupo (que, antes, em 2007, já havia lançado o segundo disco, "Zefinha vai à Feira") e de olho em seu possível registro em disco, explica Orlângelo. É nessa época também que eles ganham "O Circo da Lona Furada", agregado ao nome.

"Nós somos três irmãos e, todo mundo hoje está com menino. Isso acabou dando um estímulo para que a gente gravasse o disco. O espetáculo, na época, já era tudo isso (que é hoje), só que sem músicas autorais. Então, a gente começou a escrever projeto para editais e eu comecei a me preocupar em compor para ele", explica.

Surgem também aí parceiros como o jornalista Flávio Paiva, que assina as faixas "Marimbondo Azul", com Orlângelo, e "Pinóquio e Emília", música que encerra o disco. Também entre os parceiros estão Gerson Moreno, João Edson e Júnior Santos, respectivamente assinando "A Folha" e "Sapo Cururu".

Com o registro em disco, a lona furada dos Bufões ganha novas cores. O espetáculo, que se confunde com a própria história e identidade artística da banda Dona Zefinha, agora foi o motivo de mais uma renovação.  Quem assiste ao show, percebe claramente uma banda musicalmente mais refinada, e como sempre, ainda criativa e divertida.

Disco
O Circo Sem Teto da Lona Furada dos Bufões

Dona Zefinha

Independente

2012, 12 faixas

R$ 10



FÁBIO MARQUES
REPÓRTER
Caderno 3 - Diário do Nordeste - 04.09.2012

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