Festival Nacional de Teatro de Presidente Prudente
Podia ter dado errado. Era noite de segunda-feira, sob chuva forte e constante depois de dias consecutivos de sol escaldante, em um bairro bem afastado do centro da cidade. À espera, apenas uns aqui, outros ali, entre crianças moradoras da região, alguns poucos que vieram de longe e um desses cachorros de rua que se esticava sonolento em um canto da quadra coberta. Tirando os refletores e os instrumentos musicais que preenchiam o espaço, nada fazia crer que algo de especial aconteceria. Poucos minutos antes de tudo começar, uma alma solidária convence um grupo de garotos que estava na pracinha a se juntar aos espectadores.
Mas, dizem que, para o teatro acontecer, basta haver alguém que faz e um outro alguém que vê, mesmo que tudo conspire contra. Se o fazedor for um palhaço e o espectador uma criança, não há tempestade, falta de cadeira ou distância que impeça o convívio de acontecer. É o que comprovou a apresentação dos músicos-palhaços do Grupo Dona Zefinha, que veio de Itapipoca (CE) para mostrar "O Circo Sem Teto da Lona Furada dos Bufões" na programação do XX Festival Nacional de Teatro de Presidente Prudente.
Intercalando números musicais e circenses, a trupe cearense constrói um espetáculo sem grande elaboração ou experimentações de linguagem, mas de grande apelo popular, capacidade de interação e comunicação com a plateia, ao se apropriar de uma tradição do humor nordestino, dos pequenos circos e das cantantes das feiras livres, apostando, principalmente, no carisma da figura do palhaço, para estabelecer a conexão com o público, e na musicalidade como outra potente chave nesse diálogo.
Coube ao palhaço, bom improvisador por natureza, ganhar a empatia. Para isso, a trupe recorre à antiga (e sempre bem-sucedida) premissa do personagem fora do padrão, que sempre fracassa, seja na execução dos números mais emocionantes ou dos saltos mais perigosos, ou quando precisa contratar Ana Botafogo para uma apresentação de balé. Uma espécie de mestre de cerimônias conduz o espetáculo e estabelece, com seus comentários e propostas de brincadeira, a interação que se dá com a plateia.
Os bufões do título do espetáculo talvez estejam muito mais presentes pela heranã da irreverência do humor popular do que exatamente pela referência ao grotesco e ao dionisíaco. Mas isso, de fato, não importa nada. Porque mesmo sem bufão, sem teto e com lona furada, tudo acabou dando certo
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